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Aquiescência e política em Gramsci

Cesar Guimarães - Março 2015
 

Gomes, Victor Leandro Chaves. Por que os homens não se rebelam? Aquiescência e polí­tica em Antonio Gramsci. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2015. 110p.

O livro de Victor Gomes é uma oportuna incursão a tema importante e difícil a que se dedica a reflexão política ocidental desde seus primórdios. Por que a obediência a governos? Por que a obediência, mesmo quando governos são tirânicos? Por que a revolta é incomum, rara a rebelião? E por outra parte: como governantes garantem a aquiescência dos governados? Sendo minoria, basta-lhes o uso da força e as vantagens da organização ou precisam dispor de recursos de persuasão/legitimação?

É um caminho longo este por que se interessa o autor. Platão o inaugurou e, mais recentemente, Weber e Gramsci muito nos disseram sobre ele, inspirando literatura ainda mais recente e produção que continua a renovar-se.

Gramsci, contudo, é quem maior atenção recebe neste belo trabalho de Victor Gomes, que por isso mesmo se dedica a um entendimento próprio da noção de hegemonia na acepção em que o revolucionário italiano a utilizou. E em seus dois aspectos indissociáveis: força e consentimento, coerção e persuasão ou, em leitura diversa, poder e autoridade.

Gramsci é autor mobilizado por quem, teórica e/ou politicamente, se situa à esquerda do espectro político. Há de ser o caso de Victor Gomes, cabendo ressalvar que a esquerda melhor se descreve como um conjunto de esquerdas, hoje em dia mais ainda que no passado.

De qualquer forma, vale observar que, até recentemente, o conceito gramsciano era invocado de uma forma ativa pelo pensar/agir de esquerda: como conquistar a hegemonia na luta política na e contra a ordem burguesa? Melhor valorizar a lenta guerra de posições do que estrondosa guerra de movimento? O sujeito histórico da conquista hegemônica é o Moderno Príncipe, ou seja, o partido político da formulação gramsciana. A preocupação fundamental estava em seu sucesso na empreitada da(s) esquerda(s).

Subsidiariamente, mas não sem enorme importância, o conceito mostrava também seu poder analítico no entendimento da aceitação da ordem burguesa pelas massas, e Americanismo e fordismo é um clássico sobre a questão. Um clássico sobre o que se poderia considerar o aspecto passivo de hegemonia, sua aceitação legitimada, ou seja, aquilo a que Victor Gomes se refere como aquiescência, com o auxílio forte de La Boétie e de Foucault.

A escolha analítica do autor é interessante, original mesmo, e nada tem de gratuita ou especiosamente acadêmica. Centra-se realisticamente no núcleo decisivo da obediência política em um mundo novo repleto de "democracias de livre mercado", em relação às quais, no dizer de uma estadista de ocasião, "não há alternativa". Victor Gomes sabe que a alegada ausência de alternativa às pequenas pompas e semigloriosas obras do neoliberalismo é um dos recursos retóricos de produção desta específica aquiescência a cujo estudo se dedica. É o que melhor descreve e analisa.

Com adequado e corajoso realismo, acrescenta-se ao conjunto em expansão dos descontentes com a mesmice conservadora, cujo poder coator e persuasivo é enorme, mas já não é tão grande ou tão assustador.

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Cesar Guimarães é professor de Ciência Política do IESP/UERJ. Texto originalmente publicado como apresentação do livro.  



Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil.

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