Gomes, Victor Leandro Chaves. Por que os homens não se rebelam? Aquiescência e polÃÂtica em Antonio Gramsci. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2015. 110p.
O livro de Victor Gomes é uma oportuna incursão a tema importante e difÃcil a que se dedica a reflexão polÃtica ocidental desde seus primórdios. Por que a obediência a governos? Por que a obediência, mesmo quando governos são tirânicos? Por que a revolta é incomum, rara a rebelião? E por outra parte: como governantes garantem a aquiescência dos governados? Sendo minoria, basta-lhes o uso da força e as vantagens da organização ou precisam dispor de recursos de persuasão/legitimação?
É um caminho longo este por que se interessa o autor. Platão o inaugurou e, mais recentemente, Weber e Gramsci muito nos disseram sobre ele, inspirando literatura ainda mais recente e produção que continua a renovar-se.
Gramsci, contudo, é quem maior atenção recebe neste belo trabalho de Victor Gomes, que por isso mesmo se dedica a um entendimento próprio da noção de hegemonia na acepção em que o revolucionário italiano a utilizou. E em seus dois aspectos indissociáveis: força e consentimento, coerção e persuasão ou, em leitura diversa, poder e autoridade.
Gramsci é autor mobilizado por quem, teórica e/ou politicamente, se situa à esquerda do espectro polÃtico. Há de ser o caso de Victor Gomes, cabendo ressalvar que a esquerda melhor se descreve como um conjunto de esquerdas, hoje em dia mais ainda que no passado.
De qualquer forma, vale observar que, até recentemente, o conceito gramsciano era invocado de uma forma ativa pelo pensar/agir de esquerda: como conquistar a hegemonia na luta polÃtica na e contra a ordem burguesa? Melhor valorizar a lenta guerra de posições do que estrondosa guerra de movimento? O sujeito histórico da conquista hegemônica é o Moderno PrÃncipe, ou seja, o partido polÃtico da formulação gramsciana. A preocupação fundamental estava em seu sucesso na empreitada da(s) esquerda(s).
Subsidiariamente, mas não sem enorme importância, o conceito mostrava também seu poder analÃtico no entendimento da aceitação da ordem burguesa pelas massas, e Americanismo e fordismo é um clássico sobre a questão. Um clássico sobre o que se poderia considerar o aspecto passivo de hegemonia, sua aceitação legitimada, ou seja, aquilo a que Victor Gomes se refere como aquiescência, com o auxÃlio forte de La Boétie e de Foucault.
A escolha analÃtica do autor é interessante, original mesmo, e nada tem de gratuita ou especiosamente acadêmica. Centra-se realisticamente no núcleo decisivo da obediência polÃtica em um mundo novo repleto de "democracias de livre mercado", em relação à s quais, no dizer de uma estadista de ocasião, "não há alternativa". Victor Gomes sabe que a alegada ausência de alternativa à s pequenas pompas e semigloriosas obras do neoliberalismo é um dos recursos retóricos de produção desta especÃfica aquiescência a cujo estudo se dedica. É o que melhor descreve e analisa.
Com adequado e corajoso realismo, acrescenta-se ao conjunto em expansão dos descontentes com a mesmice conservadora, cujo poder coator e persuasivo é enorme, mas já não é tão grande ou tão assustador.
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Cesar Guimarães é professor de Ciência PolÃtica do IESP/UERJ. Texto originalmente publicado como apresentação do livro. Â